14 de jul. de 2009

Há quatro anos, o TRI

Semestre épico aquele de 2005!
A prova de que Nick Hornby está certo em "Febre de Bola".
Quando tudo vai bem na vida pessoal, o futebol conspira e se alinha ao momento trazendo uma felicidade que poucas vezes experimentamos na vida.
E vice-versa!
Quando tudo vai bem na vida de torcedor, os dias ganham cores e contornos mais vivos.
Foi dessa forma que vivi aquele primeiro semestre de 2005.

Acompanhando de longe o começo da temporada.
Da Bahia, lia que o time cascudo de Leão havia acumulado gordura para o resto do estadual, que veio fácil fácil, mesmo depois de um resquício "amarelão" da década que estava prestes a se encerrar. Uma derrota para a Lusa num Pacaembu tricolor, quando poderíamos nos sagrar campeões invictos.
Década amarga aquela!
Junto ao paulistinha, uma primeira fase complicada na Libertadores.
Vitórias num Morumbi sempre cheio, mas sempre com uma desnecessária dificuldade.
Fora de casa, três empates cascudos! 3 a 3 em La Paz, contra Strongest, 2 a 2 em Buenos Aires, contra Quilmes (quando poderíamos ter segurado a virada!) e um 1 a 1 contra Universidad do Chile, em Santiago, já com Milton Cruz como interino.
Conclave Tricolor fechado, escolhe-se Paulo Autuori!
Depois da chegada, não apenas não perdemos mais em casa, como sequer tomamos um gol!
Strongest, Palmeiras, Tigres, River Plate e Atlético Paranaense foram impiedosamente humilhados no Morumbi! (3 a 0, 2 a 0, 4 a 0, 2 a 0, 4 a 0).

A final, ah...a final!
Não estava lá no Morumbi!
Algo que me faz desejar demais outra Libertadores! Outro semestre épico.
Estava fora do continente, junto com meu irmão mais velho e minha irmã.
Passei a madrugada na internet ouvindo a festa nas coletivas pós-título!
A última cena que me recordo no telão de um clandestino bar catalão é Rogério Ceni levantando a taça.
Eternizado!
Fechando uma década horrorosa e abrindo uma nova fase gloriosa para o Tricolor!

Inesquecível!

6 de jul. de 2009

Precisamos de você

por Bertolt Brecht

Aprende - lê nos olhos,
lê nos olhos - aprende
a ler jornais, aprende:
a verdade pensa
com tua cabeça.

Faça perguntas sem medo
não te convenças sozinho
mas vejas com teus olhos.
Se não descobriu por si
na verdade não descobriu.

Confere tudo ponto
por ponto - afinal
você faz parte de tudo,
também vai no barco,
"aí pagar o pato, vai
pegar no leme um dia.

Aponte o dedo, pergunta
que é isso? Como foi
parar aí? Por que?
Você faz parte de tudo.

Aprende, não perde nada
das discussões, do silêncio.
Esteja sempre aprendendo
por nós e por você.

Você não será ouvinte
diante da discussão,
não será cogumelo
de sombras e bastidores,
não será cenário
para nossa ação

1 de jul. de 2009

Carta a um voluntário do Teto

Caro voluntário,

Vou lhe contar uma história sobre o Tempo. Não se preocupe, serei breve!

Certa vez estive no Peru. Não faz muito tempo...

Entre dias e dias de viagem, milhares de passeios por ruínas de civilizações anteriores a nossa. Desde Tihuanaco até o império Inca, que pereceu após a chegada dos espanhóis. Os europeus dizimaram índios de ponta a ponta do nosso continente e acabaram por impor um modelo de civilização que conhecemos até hoje!

Toda a forma como pensamos e enxergamos o mundo hoje tem suas raízes nos povos europeus que influenciaram quase todos os cantos do planeta. Em especial as Américas.

Mas voltando à minha viagem...

Em uma das cidades que visitei, Ollantaytambo, tive uma epifania. Um daqueles momentos de grande aprendizado, grande iluminação, em questão de segundos. Observava um santuário Inca de uma cidade que, ainda hoje, permanece usando algumas estruturas construídas antes da chegada dos europeus. Os aquedutos, por exemplo...

Esse santuário ficava no alto de um morro e atrás dele havia um vale de tirar o fôlego! O guia explicava que o santuário estava inacabado por causa da invasão dos espanhóis (sempre eles!). Apontava as evidências de que ainda faltavam pedras a serem colocadas no santuário.

Aliás, sugiro que você pesquise um pouco sobre a engenharia dos Incas. Eles eram capazes de construir um muro com pedras gigantescas se encaixando como um enorme quebra-cabeças! Não usavam nada como cimento. Só encaixe! E, acredite ou não, essas obras estão em pé até hoje. Resistindo ao tempo e aos fenômenos da natureza como terremotos, típicos no Peru. Nem mesmo as construções atuais são tão resistentes!

E lá estava eu admirando o tal santuário. Impressionado, boquiaberto, admirado!

O guia mostrou o grande vale atrás do santuário e apontou a pedraria de onde os incas retiravam as pedras para construir não apenas aquele espaço, mas toda a cidade ao redor de onde estávamos. No meio do caminho, entre o santuário e a pedraria, havia um gigantesco bloco de pedra. Arrastado e largado ali.

Sim...Drummond que me perdoe, mas no meio do caminho havia uma pedra!

Não um simples bloco de pedra, um bloco de uns 3m x 3m x 3m! Pesado como o inferno! Cortado como se fosse um dado! E o primeiro espanto é pensar como, no século XV, eles eram capazes de ser tão precisos no corte de uma pedra!

E lá continuei eu. Mirando a pedra distante e ouvindo o guia. Imaginando o momento da chegada dos espanhóis se houve conflito entre nativos e europeus. Pensando, também, em como ‘raios’ os tais incas poderiam subir morro acima com um troço daqueles sem guindastes, caminhões, helicópteros ou qualquer coisa que o valha...

O guia explicava que eles eram capazes de demorar dias, semanas, meses, anos, décadas construindo aquele santuário. Gerações indo e vindo com o objetivo de terminar de construir aquele espaço sagrado...

Foi quando ele proferiu a frase que estalou na minha cabeça: “Um homem daquele tempo era capaz de passar uma vida toda construindo algo que certamente não veria acabado. A noção de tempo deles era diferente da nossa...”

Uau! Vai ser bem resolvido com o Tempo assim lá no Peru!

Depois disso, não consegui parar de pensar em como lidamos com o Tempo hoje em dia. Sim, Tempo com T maiúsculo. Esse mesmo versado por Caetano, filosofado por Heidegger ou fabulado pelos gregos...

Nos tempos modernos de hoje, lidamos com o Tempo como se ele fosse uma ampulheta das nossas vidas individuais. Uma fina areia que corre e cai de um bulbo de vidro para outro. Cada grãozinho representa uma meta a ser cumprida, um dia a ser vivido, um ano a ser completo. Ou, no bulbo de baixo, uma memória marcante, uma cicatriz incurável, um dia inesquecível...

E dessa forma vivemos todos os dias. Sem pensar que essa forma de ver o mundo é como o ar que respiramos. Está lá, respiramos, mas nunca filosofamos sobre ele...Não é algo visível, palpável.

Entre outras coisas, essa epifania me fez pensar em nosso trabalho voluntário.

Trabalho duro!

É o dinheiro a ser arrecadado. Favelas a serem visitadas. Coletas e construções agendadas no calendário.

Nesse final de semana de construção, pilotis a serem fixados. Pregos fincados na madeira e telhado pronto para uma família ter uma casa, uma vida melhor.

Trabalhamos com metas e é normal que seja assim!

“Começou, não pára!”, como diria o outro...

E, no horizonte, uma meta difícil de digerir. É Brasil que não acaba mais! Favela atrás de favela. Barracos morro acima e famílias desabrigadas água abaixo...

Assim fica difícil mesmo! Pensar em quanto trabalho teremos pela frente...

Mas queria nos dar uma sugestão: Que tal se começássemos a enxergar nosso trabalho como os incas enxergavam aquele santuário sagrado? Que tal se pensássemos no Tempo de uma forma que fosse mais fácil de digerir nossas metas?

Assim como eles pensavam bloco de pedra por bloco de pedra, que tal pensarmos casa a casa, família a família?

Imagine um homem carregando nos ombros um bloco de pedra morro acima pensando que jamais chegaria a desfrutar daquele santuário. Que talvez nem os filhos ou os netos poderiam realizar uma cerimônia religiosa por ali...

Agora imagine que mesmo assim as pedras foram recortadas e levadas até lá! Pedra a pedra! E todas elas se encaixando.

E aquele santuário de Ollantaytambo não foi o único! Há construções como aquela espalhadas por todo o Peru, pelo Chile, pela Bolívia...

Que tal vermos o nosso trabalho como fundamental para as gerações futuras? Que tal tirarmos um pouco do peso de ‘resolver o problema do Brasil’ e pensarmos no Tempo como algo contínuo, que não está cerrado dentro de bulbos de vidro ou marcado pelas batidas de nossos corações?

Para mim funcionou. Deu um alívio!

O problema das favelas no Brasil e na América Latina não é um problema individual, um problema meu. É um problema compartilhado! É nosso!

Continuo trabalhando. Continuo a ter metas, mas faço questão de dividir esse trabalho com meus contemporâneos e com as gerações que estão por vir.

Talvez seja esse o segredo dos Incas. Suas construções, de tão sólidas, resistiram ao Tempo como poucas na História...

Um abraço e boa construção!

Mellinho